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Fapesp apoia pesquisa que desenvolve tilápias geneticamente resistentes a bactéria letal

A franciselose, doença bacteriana que afeta a tilápia-do-nilo (Oreochromis niloticus), tem se tornado uma das principais ameaças à piscicultura brasileira, especialmente durante os meses mais frios. Provocada pela bactéria Francisella orientalis, a enfermidade provoca alterações em órgãos como baço, rins, fígado, brânquias de tilápias e pode causar taxas de mortalidade superiores a 60% nas criações comerciais.

Um estudo desenvolvido no Centro de Ciência para o Desenvolvimento em Sanidade na Piscicultura, financiado pela Fapesp, confirmou a viabilidade de selecionar geneticamente tilápias mais resistentes à franciselose, dando início ao desenvolvimento de uma linhagem melhorada para resistência a doenças. Os resultados, publicados na revista científica Aquaculture, indicam que o melhoramento genético é uma ferramenta eficaz e sustentável para reduzir os impactos da doença no setor aquícola.

O trabalho foi conduzido por pesquisadores do Centro de Aquicultura da Universidade Estadual Paulista (Caunesp) de Jaboticabal, em parceria com o Instituto de Pesca (IP-APTA), e envolveu dois ciclos completos de seleção. Foram avaliadas 112 famílias de tilápias, que passaram por testes controlados para medir sua resistência à F. orientalis.

“Nós aplicamos um protocolo rigoroso de teste bacteriano em duas gerações e os dados mostraram que a resistência à franciselose tem uma base genética consistente”, explica Baltasar Garcia, pesquisador de pós-doutorado na Unesp e primeiro autor do artigo. “A herdabilidade observada foi moderada, o que significa que é possível obter ganhos genéticos rápidos na resistência à doença ao selecionar os melhores indivíduos”, complementa Garcia.

De acordo com o pesquisador, os modelos matemáticos indicam que os valores genéticos dos animais da geração selecionada para resistência foram 80% maiores do que a média da população inicial – em termos de sobrevivência a um desafio controlado. “Isso representa uma mudança significativa para os produtores, especialmente durante o inverno, quando a franciselose costuma provocar surtos mais severos”, destaca Garcia.

Impacto direto da seleção

Nos experimentos, os pesquisadores compararam o desempenho de famílias selecionadas para resistência com grupos-controle, compostos por animais suscetíveis à bactéria. O resultado foi claro: enquanto as famílias-controle apresentaram os menores tempos de sobrevivência, os animais selecionados resistiram por períodos significativamente maiores ao desafio com o patógeno.

“Observamos um ganho genético real já na primeira geração de seleção”, afirma Diogo Hashimoto, pesquisador do Caunesp em Jaboticabal e coautor do artigo. “Além disso, a análise mostrou que não houve interação relevante entre genótipo e ambiente, o que quer dizer que os animais mantêm seu desempenho tanto em temperaturas mais altas quanto mais baixas – fator crítico, já que a franciselose se agrava no frio”, completa o pesquisador.

Ainda segundo Hashimoto, a adoção de programas de melhoramento genético para resistência a doenças ainda é pouco comum na piscicultura brasileira, mas os dados do estudo demonstram que tal estratégia precisa ser adotada urgentemente como solução para o combate a doenças. “Hoje, o controle da franciselose depende majoritariamente do uso de antibióticos, que têm eficácia limitada e geram preocupações ambientais. Existem vacinas em desenvolvimento, mas a seleção genética é uma solução real, disponível e de longo prazo”, complementa.

Redução da dependência a antibióticos

Francisella orientalis é uma bactéria intracelular que provoca uma doença caracterizada pela formação de granulomas nos órgãos internos dos peixes, especialmente no baço, fígado e rins. A infecção compromete o apetite, causa letargia, ascite (acúmulo de líquido na cavidade abdominal) e mortalidade elevada, afetando principalmente alevinos e juvenis.

No Brasil, os primeiros surtos de franciselose foram registrados em 2014, mas desde esse ano a doença se espalhou rapidamente entre as criações de tilápia, que é hoje o peixe mais produzido no país. Segundo dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o Brasil responde por 8,3% da produção global da espécie.

“Essa é uma doença tipicamente associada ao inverno, porque se desenvolve mais rapidamente em temperaturas abaixo de 24 °C”, explica Hashimoto. “Mas surtos também têm sido registrados em temperaturas mais altas, o que torna ainda mais urgente a adoção de estratégias eficazes de controle.”

Os pesquisadores agora trabalham para ampliar o programa de seleção genética, acumulando a resistência ao longo de novas gerações selecionadas, incorporando o melhoramento contra outros patógenos e integrando análises genômicas que permitam acelerar ainda mais os ganhos. “Nossa meta é que, no futuro, os produtores possam adquirir alevinos já certificados não apenas para bom desempenho zootécnico, mas também para resistência a doenças como a franciselose”, afirma Hashimoto.

Para Garcia, os resultados abrem uma nova perspectiva para a piscicultura nacional. “Estamos falando de uma solução sustentável, que reduz a dependência de antibióticos e contribui para a segurança sanitária do setor. Isso é particularmente importante num contexto de crescimento da aquicultura e de aumento das exigências ambientais e sanitárias nos mercados interno e externo”, acrescenta.

Uma frente integrada contra as doenças na piscicultura

O estudo é coordenado pela pesquisadora Maria José Tavares Ranzani de Paiva, do Instituto de Pesca da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (IP-APTA).

“Nosso objetivo é desenvolver soluções integradas para os grandes desafios sanitários da piscicultura brasileira. Isso inclui ferramentas de diagnóstico rápido, vacinas eficazes e, como esse trabalho mostra, programas de melhoramento genético que tornem os peixes naturalmente mais resistentes”, afirma Paiva.

Ela ressalta que o projeto aborda não apenas a franciselose, mas também outras doenças emergentes de alto impacto econômico, como as infecções causadas pelo vírus ISKNV (sigla em inglês para Vírus da Necrose Infecciosa do Baço e Rim), e bactérias como Streptococcus e Flavobacterium. “Trabalhamos em várias frentes, desde entender a biologia dos patógenos até transformar esse conhecimento em soluções aplicáveis para o setor produtivo”, completa a pesquisadora.

“O objetivo é entregar à cadeia produtiva um pacote tecnológico que fortaleça a aquicultura brasileira, promovendo segurança alimentar, sanidade, qualidade genética e agregação de valor aos produtos, além de reduzir perdas econômicas e o uso de antibióticos nas fazendas de tilápia”, finaliza Paiva.

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